Com o aumento do número de praticantes de esportes, especialmente, os de endurance de alto volume (maratonas, triatlo, corrida de montanha, etc), a fratura por estresse, que outrora era quase que de militares, tem se tornado lesões cada vez mais comuns entre esportistas, especialmente entre as mulheres. A participação feminina nos esportes cresceu enormemente nas ultimas décadas. Hoje, as mulheres constituem mais de 40% a 50% de todos os corredores de rua. Essa participação aumentada resultou em uma incidência maior de lesões por overuse, dentre elas, as fraturas por estresse.
Quando o indivíduo treina, existe sempre um certo grau de destruição tecidual que, logo em seguida, durante o período de repouso (ou regenerativo) é compensado por produção de matriz extra celular. Em outras palavras, durante o repouso, o organismo refaz os tecidos de maneira que se tornem mais fortes: tendões, músculos e ossos, preparando-o cada vez mais para o esporte que o atleta pratica.
Para que este ciclo de destruição/reconstrução seja convertido em ganho de performance, deve haver equilíbrio, que é chamado em medicina esportiva de super-compensação. Porém, quando existe desequilíbrio e a destruição é maior, pode-se desenvolver lesões. As fraturas por estresse podem se originar de um aumento muito rápido da intensidade, volume ou mesmo de uma mudança no tipo de treino.
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Segundo alguns autores, para cada milha que um corredor percorre, mais de 110 toneladas da força devem ser absorvidas pelos pés. Os ossos não são feitos para absorver muita energia e os músculos agem como absorventes de choque adicionais. Mas, quando os músculos se tornam cansados e param de absorver a maioria da energia, as quantidades mais altas de choque vão para os ossos.
O osso envolvido é submetido a uma carga excessiva sem o devido respeito aos princípios de progressão e repouso, e inicia-se uma fratura da parte mais interna do osso (trabéculas ósseas), que pode, se não tratado, progredir para uma fratura completa.
O quadro clínico clássico é de uma pessoa que iniciou um treino de endurance sem o auxílio de um treinador , muitas vezes sem ter feito uma avaliação pré-participa (que envolve exames laboratoriais, testes físicos funcionais, exames cardiológicos e exames de equilíbrio muscular como o isocinético) com história prévia de aumento súbito de volume de treino, seguido de dor na canela, no pé ou no quadril, que piora durante a prática esportiva e melhora ao repouso. Ao tentar manter o volume e intensidade do treino, a dor se agrava e passa a incapacitar o atleta para atividades do dia a dia como dirigir e utilizar escadas.
O diagnóstico, como já descrito em outros artigos, é feito por métodos como ressonância magnética ou cintilografia óssea, que apresentam uma boa sensibilidade à lesão.
O grande desafio ao lidar com uma fratura por estresse está no retorno ao esporte. Infelizmente, após o tratamento incluindo o repouso e recursos da fisioterapia, ao retomar o treino, mesmo que de maneira gradual ocorre recidiva da lesão, frustrando o atleta e os profissionais da saúde envolvidos. Mas, por que isso acontece?
Fratura por Estresse: A ponta do iceberg
A fratura por estresse é, na verdade, a ponta de um iceberg e faz parte de uma síndrome maior provocada pelo overtraining (treino acima dos limites físicos). Fatores como a densidade mineral óssea, níveis hormonais ligados ao overtraining como o índice testosterona/cortisol, carências vitamínicas, má alimentação e uso de determinadas medicações estão por trás de uma baixa regeneração tecidual, levando a repetição dessas lesões. Em outras palavras: muitas vezes, o treino não é o “vilão”, mas sim o metabolismo do atleta. Isso explica porque as mulheres, que fisiologicamente possuem baixo nível de testosterona em relação aos homens, são mais sujeitas a estas lesões, e porque fatores como irregularidades menstruais e determinados tipos de anticoncepcionais não podem nunca ser negligenciados em uma avaliação médica.
Sanadas as possíveis alterações metabólicas e funcionais (força e equilíbrio musculares, tipo de pisada), o retorno ao esporte deve ser gradual e multidisciplinar. Na minha prática clínica, mantenho o diálogo e programo o retorno do atleta junto a seu treinador, aumentando consensualmente o volume e intensidade e reprogramando sua preparação física direcionada. Esta planilha, obviamente, deve ser individualizada e embasada na modalidade esportiva, sexo, idade e objetivos.
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