Doutor, rompi o ligamento cruzado anterior. O que acontece se eu não operar?
É muito importante relembrar alguns conceitos do ligamento cruzado anterior. Logo atrás da patela conseguimos ver o LCA. De maneira bem simples, ele possui 3 funções básicas:
1 – Estabilização Anteroposterior e Rotatória : não deixa o osso da tíbia ir para frente e não deixa o osso da tíbia rodar para dentro
2 – Reflexo de Leriche: quando solicitado, quando o joelho é estirado o LCA gera um arco reflexo medular que faz com que tanto a musculatura da parte de trás e da frente do joelho sejam ativadas e gere proteção ao joelho.
3 – Quando o joelho está dobrado e vai esticar, por exemplo ao chutar uma bola. Nos últimos graus de extensão o LCA roda para fora e funciona como um cabresto.
A indicação da reconstrução do LCA está ligada a:
Ruptura completa do LCA associada ou não ao rompimento de outros ligamentos
Nível de atividade física do indivíduo
Quanto mais jovem a pessoa que sofreu a ruptura do LCA e quanto mais completa for esse rompimento, maior as chances da indicação da cirurgia.
Um paciente de 20 e poucos anos de idade que acabou de romper o ligamento, é possível indicar a operação pois se a mesma não ocorrer, pode gerar algumas consequências a longo prazo.
Uma pessoa de 50 e poucos anos de idade, mas que não seja tão ativa fisicamente ou eventualmente faz apenas uma caminhada ou academia, tendemos a não indicar a cirurgia.
Quem rompeu esse ligamento de forma completa e não fez o tratamento indicado com a cirurgia apresentam 7 consequências básicas
1 – Se você rompeu o LCA em algum momento da vida, ou agora ou depois, terá uma sensação de falseio. É quando a tíbia anterioriza e roda para dentro. Isso acontece em ângulos de flexão pequenos do joelho, em geral entre 0 e 30°. A sensação geralmente é quando você vai jogar bola, basquete ou correr. Dificilmente isso acontece com uma pessoa que pratica luta pois o ângulo de flexão dela já é um pouco maior.
2 – Artrose: É o desgaste da cartilagem. Uma vez que você tenha rompido o LCA, essa fricção e incapacidade do ligamento de estabilizar e rodar a tíbia com relação ao fêmur faz com que a cartilagem abaixo do osso comece a se desgastar. Essa é uma teoria mecânica para explicar a artrose após lesão de LCA.
Existe também uma teoria biológica que diz que a partir do momento que você rompeu e sangrou dentro do joelho, haverá uma degeneração e quanto mais instável esse joelho, pior será essa degeneração.
3 – Danos secundários aos meniscos
Os nossos meniscos que são as estruturas com formato de C e são os amortecedores dos ossos. Como a função do LCA está prejudicada após uma lesão, a tendência é que a tíbia vá para frente e rode internamente. Os meniscos, especialmente o corno posterior do menisco medial tendem a não suportar esse estresse e acaba rompendo. Isso gera o que chamamos de Alça de Balde ou ruptura horizontal.
4 – Perda de arco de movimento
A partir do momento que houve ruptura do ligamento, ele pode cicatrizar próximo a uma outra estrutura que se chama Intercôndilo e pode começar a bloquear um pouco o joelho. A pessoa não consegue esticar nem dobrar o joelho. Algumas pessoas têm uma predisposição a ter uma reação inflamatória mais intensa e pode formar uma cicatriz na região superior do joelho fazendo com que a pessoa não consiga mais dobrar o joelho.
5 – Atrofia muscular
Por mais que a pessoa vá para a academia, é muito difícil fortalecer. Isso acontece pois o ligamento possui uma função de proprioceptiva e ao esticá-lo haverá contração da musculatura anterior e posterior que é o chamado Reflexo de Leriche. Se você rompeu o ligamento e não operou, esse reflexo está prejudicado e acaba perdendo a musculatura de dentro para fora. A parte de dentro da musculatura fica mais fina e a parte de fora também fica. A dificuldade no fortalecimento pode ser por muitas vezes um protocolo errado, não corretamente prescrito e também devido a musculatura inibida.
6 – Musculatura Agonista
A partir do momento que o ligamento cruzado anterior rompeu e existe instabilidade anterior com o chamado falseio. A musculatura posterior, a que fica atrás do joelho que chamamos de isquiotibiais e bíceps femoral tendem a trabalhar demais tentando estabilizar o joelho. Essa musculatura ajuda a estabilizar o LCA. Se essa musculatura trabalha demais, teremos duas consequências: tendência a formar uma tendinite posterior do joelho, dor atrás do joelho e a outra consequência é ter a musculatura posterior mais fortalecida, mais ativada em detrimento da musculatura anterior gerando DESEQUILÍBRIO MUSCULAR. A musculatura da frente está muito mais enfraquecida que a musculatura de trás da coxa e perna. Isso, além de gerar dor, propicia lesão muscular em quem continua praticando esporte.
A sétima e pior consequência
7 – Modificação de estilo de vida
Aquela pessoa que era ativa e jogava futebol, basquete, corria e fazia esporte de maneira bastante intensa já não consegue mais praticar pois terá medo, falseio e dor. A prática de exercícios será prejudicada.
Existem diversos trabalhos que falam sobre o tratamento não-cirúrgico da lesão de LCA. É muito importante atentar-se que na prática, as pessoas com indicação cirúrgica e que não se submeteram a cirurgia, na grande maioria dos casos precisam mudar o estilo de vida. Se você jogava bola, terá que pedalar, se correr, pode migrar para a natação… a troca de modalidade esportiva pode ser uma realidade.
Que saber mais sobre a operação do LCA. Assista ao meu vídeo no YouTube para conhecer os detalhes do procedimento: