Neste post o Dr. Adriano Leonardi, explica tudo sobre a cartilagem do joelho, desde os mecanismos de lesão, sintomas de lesão, diagnóstico, abordagens de tratamento, recuperação a prevenção de lesões.
ÍNDICE:
- O que é a lesão da cartilagem do joelho
- Cartilagem do joelho
- Destruição e reconstrução da cartilagem em nosso dia a dia
- 3 Formas básicas do desenvolvimento de lesões na cartilagem do joelho
- Sintomas de lesão na cartilagem
- Diagnóstico da lesão da cartilagem do joelho
- Principais tratamentos para lesão da cartilagem do joelho
- Tratamento não cirúrgico da lesão da cartilagem do joelho
- Tratamento cirúrgico da lesão da cartilagem do joelho
- Técnicas reconstrutivas
- Período pós operatório
- Retorno ao esporte
- Prevenção da lesão na cartilagem do joelho
O que é a lesão da cartilagem do joelho
Como já dito em outros artigos, o joelho é uma articulação extremamente suscetível a lesões de suas estruturas internas como ligamentos, meniscos e a cartilagem, motivo deste artigo. Infelizmente, a grande maioria das lesões da cartilagem do joelho não cicatrizam e, por este motivo, tornaram-se um grande desafio da medicina moderna.
Para entender por que isso ocorre, é importante entender o que é a cartilagem, confira no vídeo abaixo:
Cartilagem do joelho
A cartilagem do joelho é o tecido que recobre como um colchão a superfície dos ossos, e funciona basicamente como um grande amortecedor, absorvendo o impacto e distribuindo-o de maneira uniforme, evitando-se assim o excesso de pressão concentrado em um único ponto da articulação.
Por não possuir irrigação, a cartilagem do joelho é considerada um tecido avascular, com poucas células e abundante matriz extracelular (tudo o que existe e está fora da célula).
A cartilagem do joelho possui 4 camadas e tem muita água em sua composição (hiperhidratada, variando de 66 a 80%). Os espessos feixes de fibras colágenas, principalmente o tipo II são dispostos de maneira paralela à superfície articular formando uma “pele”, servindo não somente como uma camada limitadora mas também para a distribuição de forças de compressão.
As fibras da camada basal (mais profunda) da cartilagem ficam perpendiculares à superfície e servem como âncora fixando a cartilagem ao osso. Nas zonas intermediárias as fibras se dispõem mais ao acaso. As fibras oblíquas resistem a forças de tensões.
Destruição e reconstrução da cartilagem em nosso dia a dia
Toda vez que você realiza um treino, existe destruição parcial da matriz da cartilagem (assim como ossos, músculos e tendões). Na fase de descanso, existe reconstrução da mesma.
Para que isso ocorra, a célula da cartilagem chamada de condrócito libera enzimas de comunicação entre os glóbulos brancos (interleucinas) para as necessidades internas de remodelação sejam atendidas. Quando a destruição é igual a reconstrução, dizemos que existe homeostase. Quando a destruição é maior, teremos uma condropatia.
Sabe-se hoje que a interleucina-1 (IL-1), a interleucina-6 (IL-6) e o fator de necrose tumoral a (FNT-a) são os principais fatores que estimulam a degradação da matriz da cartilagem do joelho. Estudos recentes mostram que estas enzimas estão aumentadas em pessoas sedentárias e obesas.
Em contrapartida, as interleucinas 4 e 10 são protetoras e estimulam as formações cartilaginosas. Chamamos isso de condro-anabólicas.
3 Formas básicas do desenvolvimento de lesões na cartilagem do joelho
Micro traumas de repetição
O mau uso da articulação e o treino exagerado sem o devido recovery associado a fatores hereditários vão gradativamente causando fissuras e destruição da cartilagem, gerando reação inflamatória crônica, podendo levar à condropatias difusas do joelho, dentre elas a artrose.
Traumas agudos
Traumas agudos, como entorses e contusões do joelho, extremamente comuns em esportes de contato. Neste caso, pode haver um arrancamento de um pedaço de cartilagem, gerando as crateras. Estas lesões podem ou não estarem ligadas a lesões de outras estruturas como o ligamento cruzado anterior ou meniscos.
Um mecanismo muito comum que exige tratamento cirúrgico de urgência é quando a patela luxa (sai fora do seu trilho), arrancando um fragmento de osso e cartilagem (osteocondral) da porção lateral (externa) do côndilo femoral lateral.
Quando estas lesões focais na cartilagem do joelho ocorrem, temos a lesão da cartilagem propriamente dita, que também são chamadas de lesão condral ou lesão osteocondral da cartilagem do joelho.
Crianças e adolescentes
Em crianças e adolescentes, através de mecanismos ainda não bem esclarecidos pela ciência, gerando as chamadas osteocondrites dissecantes.
Sintomas de lesão na cartilagem
Tipicamente, os sintomas da lesão da cartilagem do joelho incluem:
- Dor na articulação – tanto no repouso, quanto durante o movimento;
- Inchaço – a lesão da cartilagem gera reação inflamatória exuberante e a membrana que recobre o joelho, também chamada de sinovial responde com o aumento do volume de liquido no joelho, que chamamos de derrame articular. Popularmente chamado de “água no joelho”;
- Rigidez;
- Estalidos;
- Bloqueio articular – incapacidade de dobrar e esticar o joelho;
- Atrofia do músculo da coxa – chamamos isso de inibição do músculo quadríceps. Ocorre como um mecanismo de defesa frente a doença articular;
- Incapacidade de realização de tarefas diárias – como caminhar, agachar, subir e descer escadas;
- Sensação de agravo diário – fadiga muscular e inchaço ao final do dia.
Diagnóstico da lesão da cartilagem do joelho
O diagnóstico da lesão da cartilagem é feito pela história de exageros no treino, com aumento súbito da velocidade e volume, especialmente na corrida de rua; ou de um entorse do joelho seguido de um estalo com dor intensa e inchaço imediato.
Se o joelho se encontra muito inchado, o médico pode fazer uma punção de alívio e enviar o líquido articular para análise patológica.
O exame padrão-ouro para se avaliar a lesão é a ressonância magnética do joelho. Neste exame, é possível observar o tamanho da lesão cartilaginosa e estimar o seu tamanho, localização dentro do joelho, como na cartilagem da patela, tróclea ou côndilos do fêmur, por exemplo, determinar o comprometimento do osso abaixo da cartilagem (subcondral).
Se existe derrame articular (água no joelho), presença de corpos livres e lesão a outras estruturas como o ligamento cruzado anterior ou meniscos.
Havendo lesão da cartilagem do joelho, a mesma é descrita pelo radiologista como por termos como “lesão condral ou osteocondral de x cm2, com edema ósseo subjacente ou fratura subcondral e volumoso derrame articular”.
Atenção inicial à lesão da cartilagem
Importante nos primeiros dias proteger a área afetada usando um suporte como uma joelheira articulada ou não, repousar, aplicar gelo sobre o joelho, manter o membro elevado e, se não houverem contraindicação clínica, pode-se fazer uso de analgésicos comuns e anti-inflamatórios.
Sempre que possível a fisioterapia deve ser iniciada, visando a redução da dor, inchaço e realizando a eletroestimulação muscular para prevenir ou minimizar a atrofia do músculo da coxa.
Principais tratamentos para lesão da cartilagem do joelho
Quando falamos sobre o tratamento da lesão da cartilagem do joelho, sendo ela cirúrgica ou não, temos que ter alguns conceitos básicos muito importantes em mente:
1 – Não existe uma técnica ou um algoritmo exato para cada tipo de lesão. Fatores como idade do paciente, nível de atividade física, localização, presença ou não de artrose tamanho e extensão da lesão da cartilagem do joelho devem ser levados em conta pelo cirurgião.
2 – Mesmo que a técnica mais adequada tenha sido escolhida e executada por um cirurgião muito experiente, a resposta biológica, ou seja, a cicatrização da cartilagem vai variar de pessoa a pessoa e o resultado final pode ou não ser o desejado. Infelizmente, é muito frequente vermos lesões sendo muito bem operadas não tendo resultados desejados.
Tratamento não cirúrgico da lesão da cartilagem do joelho
Indivíduos mais velhos e que já apresentam condropatia avançada do joelho podem se beneficiar com o tratamento conservador que engloba a fisioterapia e procedimentos como a infiltração do joelho com ácido hialurônico, procedimento conhecido como viscossuplementação; ou entrarem no rol do tratamento da artrose.
Tratamento cirúrgico da lesão da cartilagem do joelho
As técnicas cirúrgicas para o tratamento da lesão da cartilagem do joelho dividem-se em:
Técnica paliativa
Consiste basicamente na realização de uma artroscopia do joelho para realizar o que chamamos de toalete, ou limpeza, ou ainda sinovectomia. Neste procedimento, uma câmera é inserida por um orifício cirúrgico do joelho e, através de outro orifício, grande parte do tecido da artrose é retirado como espessamentos da membrana, osteófitos (bicos de papagaio) e pedaços soltos de cartilagem do joelho. O procedimento é feito em meio líquido (soro fisiológico).
O procedimento está ligado a taxas de 40 a 50% de alívio de sintomas e acredita-se que o alívio está ligado também ao fato do líquido artrítico ser lavado durante o procedimento, retirando-se portanto as enzimas inflamatórias.
Técnica restauradora
Tradicionalmente conhecida como técnica da micro fratura. A ideia básica é a de retirar a cartilagem lesada e estimular a criação de um novo tecido através de raspagem óssea, que chamamos de cruentização, seguida da confecção de diversos pontos de perfuração com um instrumental que chamamos de “ice picking”.
Com isso, espera-se que haja migração de células-tronco da medula óssea que se transforma em um tecido muito semelhante à cartilagem do joelho original denominada fibrocartilagem.
Técnicas reconstrutivas
Biomembrana
Técnica relativamente nova, onde o defeito cartilaginoso mais extenso é também trabalhado, perfurado, e a seguir, uma membrana biológica (biomembrana ou scafold) é inserida e as bordas do defeito são costuradas, tampando-se o defeito da cartilagem do joelho. Acredita-se que assim haja formação de uma cartilagem o mais semelhante possível da original do joelho.
Mosaicoplastia do joelho
Técnica mais tradicional, onde o defeito cartilaginoso é trabalhado e retirado através de um tubo oco que chamamos de trefina. A seguir, o defeito é preenchido com um plugue contendo osso e cartilagem (osteocondral) de mesmo tamanho retirado de uma área cartilaginosa doadora sadia, em geral, uma área que não recebe peso. Neste procedimento, diversos plugues osteocondrais podem ser retirados para o preenchimento da lesão.
Técnicas cirúrgicas menos comuns
Há também uma série de técnicas cirúrgicas alternativas usadas às vezes para tratar os danos da cartilagem, incluindo:
Transplante osteocondral de aloenxerto
Semelhante à mosaicoplastia, mas com a diferença da cartilagem de substituição ser obtida de um doador cadáver. Indicada para lesões muito grandes e extensas da cartilagem.
Transplante autólogo de condrócitos
Esta técnica desenvolvida na cidade Sueca de Gotemburgo, onde tive o prazer de realizar meu aprimoramento, envolve conceitos básicos de engenharia de tecido. Nela, primeiro pegamos uma pequena amostra de células de cartilagem da articulação. A seguir, é realizado o cultivo de mais células em um laboratório. Na terceira etapa, o paciente é novamente operado e as novas células são usadas para substituir a cartilagem danificada.
Técnicas associadas
Osteotomia
Dependendo da localização da lesão e do formato dos joelhos, pode ser necessário reduzir o peso no local onde se trabalhou. Por isso, tanto a osteotomia varizante, quanto a valgizante podem ser indicadas para o geno valgo (joelho em x), quanto para o geno varo (joelho do cowboy).
Subcondroplastia
Consagrada para condropatias mais avançadas, onde existe o edema ósseo. Pode ser utilizada em conjunto à técnica cirúrgica utilizada ou tardiamente para controle da dor.
Período pós operatório
O tempo de recuperação de uma cirurgia da cartilagem do joelho é bastante variável. Como o peso do corpo pode influenciar negativamente a cicatrização esperada, em geral, pedimos para que os pacientes utilizem 1 par de muletas com restrição total de peso de 6 a 8 semanas.
A fisioterapia deve ser iniciada o mais rápido possível para analgesia, ganho de flexão e extensão do joelho e minimização da atrofia muscular do membro operado. Quando possível, a hidroterapia também der ser iniciada, pois permite mobilidade precoce a ajuda a reduzir o inchaço do joelho.
Passado o período inicial, estimulamos que o paciente vá soltando lentamente o peso no membro e o trabalho de fisioterapia vai evoluindo para que, mais tardiamente haja ganho de força, equilíbrio e agilidade motora.
Controle da cicatrização da lesão cartilaginosa
Não existe consenso na literatura médica de qual seria o período final da cicatrização da lesão. Mas sabemos que ela costuma ser mais tardia. Por isso, geralmente entre o 6º e 8º mês, solicitamos exames de imagem de controle.
Recentemente, entrou no rol dos exames de imagem a ressonância nuclear magnética com realce tardio por gadolínio (dGEMRIC).
Com imagens coloridas, ela permitiria diferenciar a cartilagem do joelho mais nova e recém-formada da cartilagem mais antiga, e apesar de ainda estar em estudo, ajudaria a predizer sobre o sucesso de qualquer um dos procedimentos cirúrgicos citados.
Retorno ao esporte
A fase final da reabilitação de uma cirurgia da cartilagem e transição ao deve ser lenta, criteriosa e assistida por uma equipe multidisciplinar, onde testes funcionais e isocinéticos são utilizados como parâmetros de bom estado muscular.
O fortalecimento muscular deve ser realizado com um profissional de educação física capacitado, utilizando protocolos que não causem sobrecarga no joelho. Nesta fase, dor, inchaço e sensação de falseio indicam que algo não vai bem e o paciente deve ser reavaliado pelo cirurgião.
Prevenção da lesão na cartilagem do joelho
A prevenção da lesão da cartilagem do joelho, assim como de qualquer tipo de condropatia envolve parâmetros como:
- Manutenção da força muscular – mesmo que você pratique esportes como a corrida, futebol, o tênis e ciclismo mantenha o treino de força (musculação) na periodização de seu treino.
- Realize treino funcional – especialmente se você pratica esportes de contato, drible ou mudança súbita de direção.
- Fortaleça o CORE – o fortalecimento da musculatura da coluna e quadril é fundamental na prevenção de distúrbios biomecânicos que podem levar a diversos tipos de condropatia.
- Proteja seus joelhos – Para esportes que exigem carga exagerada nos joelhos como o levantamento de peso e o crossfit, recomenda-se a proteção por enfaixamento ou joelheiras.
Não realize aumento súbito de volume e intensidade do treino. Se existe o desejo de competição, o incremento de carga deve ser gradual e assistido por um treinador.